Entrevista com Groundation (Portal do Reggae)






Groundation hoje em dia é um nome que quase todos os fãs da música Reggae já ouviram falar. Depois do sucesso do seu último álbum «We Free Again» lançado no final de 2004, os jovens Californianos voltaram com um sexto álbum chamado «Upon The Bridge». É realmente um álbum de grande qualidade, preenchido com influências Dub e Jazz que se juntam à enorme educação musical destes músicos. No entanto, os quatro membros construtores da banda conheceram-se numa Universidade da Califórnia onde todos eles estudavam Jazz... O respeito obtido pelos grandes músicos Jamaicanos é provado pela presença neste último álbum de duas das grandes estrelas do Reggae Jamaicano dos anos 70 : Pablo Moses e Ijahman Levy (Jah Heavy Load ). Durante a sua tournée pela Europa, Harrison Stafford, vocalista desta banda, aceitou responder-nos a algumas perguntas.

(entrevista concedida ao portal do reggae)

Portal: Porque chamar este álbum “Upon The Bridge”, qual o significado real deste nome?

Harrison - A maior parte das vezes o nome do álbum é a última coisa a semear. Eu lembro-me de o nosso artista Visual Giovanni Maki esperar ansiosamente pelo nome dos álbuns, e finalmente "Hebron Gate" nasceu. No entanto, com "Upon The Bridge" foi diferente. Já tínhamos o nome muito antes do álbum estar pronto. A maior parte das letras das canções falam deste tema, a embalagem do álbum inclui uma breve história baseada nas letras das canções, então literalmente existe um história acerca de tudo isto que poderão consultar.

Trata-se de um história interessante que começa com o nosso primeiro álbum "Young Tree". é o desenvolvimento próprio, individual, fala da luta que eles se viram rodeados e do que eles sentiram acerca disso. "Upon The Bridge" fala de agora, 2006. Eu penso que hoje em dia toda a gente carrega um enorme fardo, esta necessidade de mudar a nossa maneira de viver se é que queremos ver um futuro sólido para as nossas crianças e para as futuras gerações. Então nós estamos em cima dessa ponte (upon the bridge), não num chão sólido.

Nós Groundation viajamos pelo mundo espalhando estes pensamentos, temos encontrado boas pessoas em todo o lado, pessoas que sentem e pensam o mesmo que nós. Já não vivemos na Califórnia, a nossa família, amigos, e casas podem estar, mas nós estamos navegando juntamente com todas essas pessoas.



Portal: As suas composições estão repletas de influências Dub, e em Fevereiro do ano passado vocês lançaram um álbum chamado "Dub Wars" que contêm algumas versões Dub dos melhores temas de álbuns passados tais como "Hebron Gate" e "We Free Again". Pode explicar o interesse neste estilo musical? Será que é porque o Dub abre as portas para o improviso?

Harrison - Em toda a minha vida amei e admirei a música Dub. É claro que fico muito excitado pelo fato de o engenheiro de som se tornar um músico e através das suas performances ele consegue transformar as versões originais num novo som. O nosso lançamento Dub é único porque Marcus Urani (teclista) pegou nos arranjos Dub que compilamos com Jim Fox (engenheiro) e juntou-os aos seus, introduziu-lhe alguns improvisos Dub elaborados por si. É um pouco difícil de explicar, ele junta duas versões Dub, daí arranja-as e fica só com uma, é um som único, nós chamamos-lhe o "Double Dub".




Portal: Mais uma vez este álbum soa um Jazz. Para você, como é que a educação Jazz pode influenciar nas produções Reggae?

Harrison - Esta educação tem uma influência muito pesada em todos nós, e o fato é que passamos grande parte das nossas vidas infiltrados na música, esses conceitos "avançados" surgiram com a experiência, o nosso coletivo improvisa, e a nossa proximidade com a música faz-nos produzir um som fresco e agradável. Nós passamos (e continuamos a passar) imenso tempo estudando a nossa arte, recebemos uma séria educação na teoria da música, o que nos deu uma maneira esplêndida de poder comunicar, poder transmitir os nossos pensamentos através da música, ganhamos uma linguagem comum em que podemos partilhar as nossas ideias, é fenomenal!

Não estamos simplesmente unindo o Reggae com o Jazz, estamos sim construindo um projeto próprio que nos guia até à música nova e original.





Portal: Como aconteceu a tua junção a Pablo Moses? Já não se ouvia falar dele há imensos anos... Foi um agradecimento pelo seu álbum "Pave The Way" que recentemente foi remasterizado por Jim Fox e lançado pela label Young Tree Records? E já agora Ijahman, já o conhecia antes disso?

Harrison - Eu já conhecia Pablo Moses há algum tempo e tenho uma relação muito próxima com ele. No entanto, estávamos conversando pelo telefone acerca de música e trabalho e eu perguntei acerca do "Pave The Way". Eu disse, "O que aconteceu a esse grande álbum? Tenho-o em vinil mas nunca o vi em cassete ou CD." Ele disse que tinha a gravação original mesmo ao seu lado, no sofá. Fiquei extremamente surpreendido e rapidamente lhe ofereci a possibilidade de remasterização para CD. Trabalhamos imenso nesse projeto, tanto eu como ele estamos muito satisfeitos com os seus resultados. Eu estou particularmente feliz porque "Pave The Way" foi um álbum que me ajudou a crescer.

Quanto a Ijahman, não o conhecia até há uns meses atrás... Conheci em frente ao Harry J`s, o estúdio Jamaicano que usamos para gravar o "Upon the Bridge". Ijahman e Pablo são grandes e lendários artistas. Eles tocaram profundamente a minha alma desde o primeiro momento que ouvi as suas vozes. Não consigo descrever o que senti durante essas gravações, foi um dos grandes momentos da minha vida...

Portal: Agora vamos falar um pouco sobre você....

Lembra da primeira vez que ouviu Reggae? Qual a canção e qual o artista?

Harrison - Lembro de Bob Marley... Peter Tosh...Culture... Especificamente dos álbuns Rastaman Vibration, Equal Rigths, e Nuff Crisis. Eu era muito novo, não sabia porque gostava tanto de Reggae... Se me perguntassem, eu não saberia responder... apenas sentia que aquilo estava bem e tinha sentido...





Portal: Sendo um Californiano, porque decidiu cantar Pátoi Jamaicano?

Harrison - Eu acho que não decidi cantar em Pátoi, isso é algo que sai de mim quando canto. Tenho consciência disso, não entra nos meus pensamentos quando canto. Tem um ritmo, uma rima, uma vibe(rs)... Eu falo Pátoi de vez em quando na Jamaica, ao telefone com amigos que tenho lá, até no dia-a-dia normal o Pátoi sai, por vezes as pessoas ficam olhando para mim...

Muitas das pessoas que me conhecem dizem que o Pátoi faz parte de mim, dizem que não sou da Califórnia mas sim da Jamaica.

A primeira vez que cantei Reggae foi em Pátoi Jamaicano, as pessoas percebem e não há nenhuma brincadeira nisto.

Portal: Quais as razões que te levaram até à Jamaica? Como foi a tua primeira vez lá?

Harrison - A Jamaica e o Reggae sempre fizeram parte da minha vida. Foram os meus pais que me apresentaram a uma família Jamaicana, eles tinham um filho da minha idade chamado Leighton Lugg, fizemos uma grande amizade, fiquei com eles em St. Ann`s Bay (Charles Town) e conheci muitos jovens da nossa idade, em pouco tempo ficamos como "irmãos". Eu vi pessoas muito boas crescendo, novas pessoas nascendo, grandes amigos indo embrora... Inclusive toquei guitarra na igreja batista de St. Ann`s.

Portal: Pode descrever a cena Reggae na Califórnia? A preferência lá na sua opinião é mais por Roots Reggae ou por Dancehall e Soundsystem`s?

Harrison - Temos de tudo lá, existe uma boa mistura de Roots e Dancehall. Basta descer a minha rua até ao Sebastopol, logo temos diversos soundsystem`s passando Roots ou Dancehall todas as terças e sábados. Sou capaz de afirmar que nos Estados Unidos não existe melhor sítio para ouvir Reggae que a Califórnia.




Portal: Sabemos que ensina História da música Reggae na universidade. Já ouviu falar num livro chamado "Book of Memory, Rastafari testimony" escrito em pátoi por Rasta Elder Prince Elijah Williams?

Harrison - Você é a terceira pessoa que mencionou esse livro. Ainda não encontrei uma cópia impressa desse livro na Califórnia, mas quando encontrar vou ler com certeza...obrigado (risos).

Portal: Muitos Jamaicanos já participaram dos seus álbuns (Don Carlos, Márcia Higgs, Ras Michael, Apple Gabriel, Cedric "Congo" Myton e agora Pablo Moses e Ijahman?, ainda existe algum ou alguns artistas que deseja ter a sua participação em trabalhos futuros?


Harrison - Nós temos planos para o futuro, muitas ideias surgem, mas demora muito tempo até concebe-las.

Eu espero enfrentar o mundo sem nenhuma apologia. Um álbum com Joseph Hill (falecido) e Burning Spear sempre foi o meu sonho... Joseph foi um grande amigo, um grande professor para mim, sinto muito a sua falta. Quanto ao futuro ... Só Jah sabe... (rs)

Portal: É verdade que esteve na Jamaica com Mortimmer Planno, mentor de Bob Marley e seu conselheiro espiritual, e que também conheceu Joe Higgs, o seu professor? O que aprendeu com eles?

Harrison - Sem palavras... Esses foram os tempos que mais me tocaram em toda a minha vida. Planno, Higgs, Hill... todos partiram.

Existem outros grandes nomes para adicionar, podemos falar de Ras Pidow, considero-o também um professor.

Joe Higgs ofereceu a sua vida e a sua música aos Jamaicanos, ele próprio nunca teve muita fama. Limitava-se a ajudar todos com o seu bom coração. Uma vez me disse para eu lutar sem parar, a recompensa seria boa. Não falava de uma recompensa física, mas sim de uma recompensa espiritual que permanecerá através da idade e nada poderá impedir isso.

Planno era uma pessoa muito focada nos seus ideais. Me lembro uma vez na Jamaica discurssando na rua acerca da Luta Africana, da necessidade de um mundo unido debaixo das cores Rastafari, Vermelho, Amarelo e Verde.

Ele falou de Marcus Garvey e Selassie, até de Martin Luther King e Malcom X, partilhou com o povo as suas ideias positivas. Planno foi importantissimo para a fundação do movimento Rasta, foi dos primeiros a usar Dreadlock`s e a lutar contra o sistema. No entanto, eu era muito jovem aí, quase só me lembro de ele me ensinar a ter respeito e a usar o meu Tongue.

Portal: Vários Jornalistas dizem que você é o "novo Bob Marley". Qual é a sua reação quando escuta essa afirmação?

Harrison - O quê que posso dizer? Bob Marley foi um grande homem que se dedicou a lutar pela igualdade e pela justiça. Um homem que sonhou que um mundo de amor e união iria substituir este em que vivemos, tal como , a música era a sua arma. Marley tornou-se numa força inigualável que jamais se encontrará igual na terra.

Portal: O que pensa do recente regresso da música Roots à Jamaica? Chamam de o "regresso do One Drop", acha que este regresso é verdadeiro, que os novos artistas estão ficando mais conscientes ou que isto é apenas uma moda criada pelos produtores para reconquistar as audiências Americanas e Europeias já fartas do Dancehall e das letras " assassinas"?

Harrison - É uma boa questão... Sinceramente nem sei bem... Eu amo o Roots Reggae, o original "One Drop", mas não estamos no mundo para ressuscitar antigas vibrações, mas sim para criar novas. Estamos aqui para inspirar e criar amor e reverencia nesta vida... para toda a gente.

Eu espero que a música Jamaicana volte ao "Roots & Culture", que voltem as letras conscientes. No entanto, eles têm que se lembrar que isto não é música Pop, não pode ser produzida como um produto. Isto quer dizer que não podemos ser positivos hoje e amanhã sermos rudes. Se as pessoas forem verdadeiramente conscientes conseguem superar essas tentações...

Portal: Agora que está "Upon The Bridge" (em cima da ponte) pode dizer o que está no outro lado?

Harrison - É uma questão muito complexa musicalmente e socialmente. Tudo o que posso adiantar é que boas mudanças vão surgir. (risos)



Obrigado pela entrevista, parabéns pelo teu trabalho Harrison.

Guidance and blessings to you guys... - Harrison( rs)



Mais infos: http://www.groundation.com

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